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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    47 Setembro 2018  
 
 
NOTÍCIAS DO DEPARTAMENTO

AUTORES E LEITORES DEBATEM NÚMEROS 58 E 59 DA REVISTA PERCURSO


MANIA DEWEIK[i]


No dia 18/08/2018 realizamos o Debate de dois números da Percurso, o número 58 e o 59. Como sempre foi uma reunião cordial, aberta a muitas falas e ideias diversas. E, como de costume, é sempre uma surpresa e um encantamento nos debruçarmos sobre as revistas depois de prontas – estas depois de quase um ano de distância. “Reavivamos textos que discutimos há tempos atrás”, diz Lila, membro do Conselho Editorial.


Confeccioná-las traz um montante de angústia: sustentar uma postura ética e ao mesmo tempo plural, dar lugar tanto à clínica quanto à metapsicologia, abarcar a complexidade do mundo e da psicanálise em suas mais variadas manifestações, mantermo-nos em contato com instituições que expandam os horizontes da revista, rever a história de nosso ofício, arejarmos espaços para falar da formação, tudo isto de olho nas transformações do mercado editorial visando ao campo da digitalização e às exigências de indexação.

Nos números em questão – tanto no 58 quanto no 59 - relatávamos, nos editoriais, a perda de colegas de trabalho muito atuantes e queridas: Eliane Berger e Silvana Rabello. Uma de nossas articulistas, Adela Stoppel de Gueller, nos relatou como nossa solicitação para que revisse o texto de Silvana, parceira com quem trabalhou por mais de 20 anos, a convocação à escrita, a ajudou na elaboração de seu luto.

Escrever é preciso, escrever a clínica é imperativo, discuti-la com vários interlocutores é vital. Foi assim que se iniciou nossa conversa: colocando a seção Debate Clínico em evidência a partir da presença de Alejandro Viviani, um debatedores do número 59, incitado por nosso colega Sérgio Telles, coordenador deste espaço na Revista.

Só para lembrar: nesta seção, criada há 5 anos, convida-se dois debatedores psicanalistas a se debruçarem sobre um material clínico que recebem anonimamente e a discutirem o texto a partir de sua experiência.

Algumas linhas de pensamento delineiam o caminho da discussão que se instala, colocando em foco distintos modelos clínicos: qual a linha teórica e a hipótese clínica daquele que apresenta o caso? É preciso que transpareça na escrita como pressuposto na condução da análise ou é apenas uma questão de estilo? Fala-se do Seminário 13 de Lacan: qual seria o objeto em/da Psicanálise? E o lugar da transferência, qual seria ? Qual o lugar dos pensamentos do analista na condução da análise? A contratransferência compõe o campo transferencial em beneficio da análise, é o efeito da transferência do paciente ou desvia a atenção do analista, sendo um fenômeno que tem a ver com a sua história, a ser tratado em sua própria análise? Que lugar tem a teoria na análise de cada caso?

Adela, a partir de sua pertinência ao Departamento da Psicanálise com Crianças, se posicionou ressaltando o quanto este dispositivo permite saber como cada analista constrói o caso, o valor que isto ocupa na transmissão e como a Percurso tem sido útil neste quesito com seu compromisso com a pluralidade de linhas teóricas e escritas diversas, advindas de vários campos do conhecimento.

O dispositivo Inquietações da Clínica Cotidiana foi mencionado, uma vez que nele a discussão do caso clínico é realizada em um espaço de diálogo, em presença dos analista e dos interlocutores.

O diálogo, palavra viva em oposição à escrita - palavra morta, segundo Platão. Maria Antonieta Pezzo efusivamente defende a palavra escrita como viva e necessária!

Maria do Carmo Dittmar (Lila) sugere que o analista cujo texto foi discutido deveria ter direto à replica, trazendo novas contribuições à discussão. Ficou a sugestão, a ser pensada.

Neste sentido abre-se uma perspectiva, através da fala de Susan Markuszower, sobre a valorização de algo “intuitivo” no espaço da sessão de análise. Renato Mezan a retoma com o nome de revêrie. Seria uma forma de “mostrar-se” que não caracteriza apenas os Debates Clínicos mas também os artigos, as resenhas, as entrevistas.“Discutimos textos e não pessoas (...) lemos psicanálise para aprender a pensar psicanaliticamente, com o relato de casos aprendemos como construir o material clínico”, sintetiza.

“Em cada intervenção o terapeuta se destitui de seu lugar de analista” retoma Viviani.

Maria Laurinda Ribeiro de Souza afirma que esta seção tem aspectos “perturbadores” e que gostaria de aprofundar a conversa sobre as seções da revista. Aponta para vários textos interessantes, tais como os de Camila Flaborea e Milena Narchi.

O primeiro apresenta um diálogo entre literatura e psicanálise, trazendo à tona questões suscitadas pelo adoecimento fronteiriço, propondo uma escuta polifônica tanto para o enquadre como para o manejo clinico. O de Milena, contundente, reflete a experiência de um atendimento em uma Moradia Assistida em um Hospital Psiquiátrico, os atravessamentos institucionais e a exposição à violência exercida sobre os pacientes.

Adriana Barbosa Pereira, resenhadora do livro de Marina Bialer e de Silvana Rabello, que faleceu alguns dias antes do lançamento previsto para o livro Laço mãe-bebê: intervenções e cuidado, discute se caberia ao psicanalista ocupar-se de um bebê ou dos laços primordiais em construção. As intervenções na infância vêm gerando controvérsias teóricas e nos marcos legais de proteção à criança e nas diretrizes em Saúde Mental.

As falas ressoam trazendo questões da modificação do Estatuto da Criança para avaliação de recém nascidos e a preocupação com o destino da políticas públicas e desmonte do SUS.

Para Camila Flaborea, Percurso abre espaço para a escrita sobre os adoecimentos silenciosos, o não comunicável, a sensorialidade. Conta que em 2016 descobriu Maura Lopes, autora mineira que escreve um relato de quando internada nos anos 40, tempo da lobotomia. Recomenda a leitura de O hospício de Deus e O sofredor do Ver.

Sílvia Nogueira faz eco a esta fala comentando sobre os espaços oferecidos pela revista e a importância de publicar um dos passos de uma pesquisa que vem realizando em sua clínica, na qual interroga a relação entre arte, a cidade e criação de sentido.

Silvia Ribes compartilha a dificuldade que enfrenta em sua clínica como psiquiatra, fala da medicação e da busca dos laboratórios por pacientes que poderiam ser consumidores. Questiona o quanto a substância química é fonte de fantasias e qual a representação psíquica do medicamento. Para além da medicalização também falou sobre a incidência dos critérios de pagamento dos convênios de saúde na condução das análises.

Muitas questões, muito a refletir... o Debate cumpre sua função de implicação com os fenômenos da atualidade e reflete as preocupações dos analistas diante das mudanças históricas e sociais. O próximo, agendado para março do próximo ano, será o da comemoração de 30 anos de Percurso, número duplo 60/61, dedicado a Regina Schnaiderman.

Terminamos nosso encontro em tom de comemoração: para celebrar o mês do psicólogo o CFP resolveu homenagear psicólogos que têm contribuído na construção da Psicologia Brasileira. Na escolha dos nomes homenageados o CFP contou com a contribuição do Fórum das Entidades Nacionais da Psicologia Brasileira. Entre os homenageados foi escolhida Madre Cristina in memoriam e Maria Auxiliadora Arantes (Dodora) que participou das comemorações em Brasília. Uma calorosa salva de palmas foi lhe dedicada pelos presentes.

Agradeço a Ana Maria Leal[ii] pela ajuda com anotações durante o debate e pela conversa que realizamos para “enxugar” o material.



[i] Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. Professora e supervisora do curso Psicopatologia Psicanalítica e Clínica Contemporânea. Membro do Conselho Editorial da Revista Percurso.

[ii] Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. Professora do curso de Psicopatologia Psicanalítica e Clínica Contemporânea, deste mesmo Instituto.




 
 
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