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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    37 Abril 2016  
 
 
NOTÍCIAS DO DEPARTAMENTO

SOBRE O DISPOSITIVO DAS APRESENTAÇÕES PÚBLICAS
DOS NOVOS MEMBROS DO DEPARTAMENTO


EQUIPE EDITORIAL DO BOLETIM ONLINE [1]

As apresentações públicas simbolizam o final do processo de admissão de um candidato a membro do Departamento ao mesmo tempo que o início de suas atividades como membro efetivo. É um marco de passagem, de entrada, aberto ao reconhecimento entre pares. Pode ser um momento de rica discussão clínica e de troca entre psicanalistas que escolhem pertencer a uma associação que sustenta a psicanálise como campo teórico-prático em movimento, sempre em trabalho. Dessa forma se pretende criar um ambiente fecundo, diversificado e consistente para a interlocução.

Acompanhamos as mais recentes apresentações de novos membros do Departamento: Rosangela Rodrigues Gouveia, Tide Setubal Souza e Silva Nogueira, Paulina Schmidtbauer Barbosa Rocha, Luiz Gustavo Caleiro e Wild Veiga.

Rosangela Gouveia apresentou o caso clínico Do esvaziamento à vida: O caminhar de Valkiria, em torno da história de uma mulher que chegou ao consultório desvitalizada e com um marcante empobrecimento afetivo. Apoiada no trabalho de André Green sobre as falhas narcísicas e sobre o luto branco, a analista relatou o percurso que possibilitou construir aberturas psíquicas decorrentes do reinvestimento narcísico operado através da escuta analítica na sustentação transferencial e vincular. A radicalidade do acaso apareceu quando, num momento de subjetivação importante, no qual a paciente se apropriava da afetação de estar viva, contingências cruciais atravessaram o atendimento e convocaram a clínica para fora do consultório. O desdobramento do caso e o impacto que ressoou em todos os presentes apontou para o processo de escrita e de apresentação pública como momento importante na elaboração clínica do caso.

Tide Setúbal apresentou o caso clínico A voz opaca do espelho identificatório de Antônia. Ao relatar o percurso de Antônia, a analista teceu articulações de questões teóricas relacionadas ao processo de construção das identificações, especialmente no que tange às identificações femininas numa trama transgeracional. Iniciando a análise num lugar subjetivo indiferenciado e desvalorizado, acompanhamos o processo de construção de um novo lugar subjetivo feminino mais denso e habitável, a partir da possibilidade de se perguntar sobre suas escolhas  amorosas, assim como da possibilidade de entrar em contato com a história de sua família, sobretudo das figuras femininas e de suas relações que eram, até então, em grande medida desconhecidas por ela. Articulando a narrativa clínica numa instigante interlocução com Sylvie Le Poulichet e Silvia Alonso & Mario Fuks, a analista levantou questões clínicas tais como: o fracasso das identificações especulares com a mãe, as complexidades presentes na escolha de objeto amoroso, as incorporações como processo psíquico metabólico distinto das introjeções e a transmissão transgeracional entre avó, mãe e filha. Todo esse tecido clínico-teórico produziu um ambiente de discussão fecundo e participativo entre os presentes ao encontro.

O argumento da apresentação de Paulina Rocha foi construído em torno do valor do enquadramento da sessão. Para a colega croata, fundadora do CPPL (Centro de Pesquisa em Psicanálise e Linguagem) e integrante do Círculo Psicanalítico do Recife até sua mudança para São Paulo – onde seu trabalho já era bem conhecido e apreciado -, “o espaço potencial é mais importante que o objeto transicional”. O caso A sobrevivente: quando o tempo cortou o espaço focalizou o percurso de um atendimento clínico de mais de 20 anos em que se apresentaram os terrores da mulher moradora de rua que “sempre soube que era frágil”. Ao chegar à clínica, Maria José se recusava a se identificar e demandou, ao longo de um ano, que a presença de duas analistas da equipe da Unit sustentasse a rede tensional libidinal grupal a partir da qual Paulina passou a conduzir um delicado trabalho analítico, desafiador dos limites da analisabilidade. Neste processo, chamaram nossa atenção tanto a potência criadora de uma lógica temporal específica – um atendimento semanal de 3 horas de duração, recortado em 3 tempos: 45 minutos para Maria José se chegar, 45 minutos para a sessão de análise, 45 minutos para a conversa do lanche – quanto a presença de espírito da analista, ao impedir, fisicamente, que Maria José continuasse a queimar a si mesma quando ouvia a palavra “mãe”. A partir dessas intervenções de força da analista, a paciente pode construir possibilidades subjetivantes. Assim Paulina, que afirmou valorizar desde tempo atrás nosso Departamento e considerar que abriga um dos melhores modos de transmissão da psicanálise que conhece, inaugurou, tranquilamente, seu novo espaço de trabalho entre nós.

Gustavo Veiga apresentou A fotografia revelando o artista, caso em que os enquadramentos clínicos foram revisitados. Tratava-se de seguir em busca da língua mais apropriada às construções psíquicas necessárias para suplantar as imateriais experiências depressivas em jogo na sessão. Da perspectiva em que o analista “precisava da fala para trabalhar” – baseado na análise institucional do discurso e na concepção freudiana de sintoma – à sustentação da amorfia como matriz da criatividade, o trabalho de Gustavo foi sensível às sobreposições entre vida e obra que obstaculizavam o trabalho elaborativo, ao investir na criação de um contexto que se tornaria mais importante que a interpretação. Uma fotografia de longa duração, clicada em sessão, funcionou como representante desta travessia em que, lá fora, um artista pode dar a ver sua obra. A animada discussão que se seguiu à apresentação permitiu que o coletivo do Departamento revelasse uma interessante diversidade de estilos de interlocução.

 




 
 
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