EQUIPE DO BOLETIM ONLINE
Eis que no sábado, 15 de agosto, aconteceu o primeiro debate
on line de Percurso. O costumeiro debate presencial da revista, inicialmente agendado para o dia 14 de março, havia sido adiado em observância às orientações da Saúde Pública para o engajamento na política de contenção de riscos relativos à pandemia do corona vírus.
Em pauta, afinal, a edição 61, de dezembro de 2018. Através das palavras antecipadamente registradas por Lourdes Costa, em nome do Conselho Editorial, os leitores puderam aquecer-se para o encontro remoto advertidos da atualidade das questões propostas:
Saltou-me aos olhos a palavra “epidemia”. A data verificada por súbito descrer, era mesmo de 2018. Epidemia de autismos. Fraturas de uma civilização, esclarece a autora.
Outros quadros nosográficos são construídos - e medicalizados – obliterando-se uma pluralidade de experiências infantis que aguardam escuta e inscrição. TDAH, o corpo tomado pela hiperatividade e o medo (materno) da depressão, da morte.
Mal-estar na civilização, mal do ser, mal de ser.
A escrita, a clínica, os processos de subjetivação não cabem no leito de Procusto, diz outra autora.
Percorremos outras páginas e encontramos anonimato, exclusão. Naturalização, imunização.
Mas também: encontro com Outro e descentralização do sujeito, clínica psicanalítica e SUS, “escuta territorial”, atendimentos nas ruas de Buenos Aires e de São Paulo, trabalho vincular, traumas e a clínica de grupos, agrupamento de jovens e a noção de fratria, entre tantos outros temas.
A pandemia que ora vivemos veio acelerar processos em curso.
Na clínica os desafios são imensos.
Com mais uma autora, perguntamos: Como produzir desvios aos estancamentos da vida?
A vivacidade das presenças em tela estendeu a conversa até as 13h30. E consentiu-nos a eloquente crônica de Ilana Berenstein e Ana Cecília Moraes, especial para este Boletim, assim como a relação de links interessantes colhidos nas múltiplas referências que pontuaram a sabatina. Leiam a seguir, enquanto aguardamos o próximo encontro desta nova série!
CRÔNICA SOBRE O DEBATE DA PERCURSO 61
ILANA SAFRO BERENSTEIN[1]
ANA CECÍLIA MORAES WEINTRAUB[2]
O link não é exatamente um link, há um caminho a percorrer.
Tanta gente interessante, como pode o setting ser essa telinha de celular?
Com licença, estamos em atenção quase que flutuante.
Lourdes conduz, as pessoas falam, “Vocês me escutam?”.
Nas apresentações oferece-se uma pitada viva do aporte que viera cuidadosamente escrito, provavelmente escrito há anos já.
Oi Lucia, saudades, sim, a história da Psicanálise.
Aquela sensação de que são tantos os assuntos, tão infinitas as possibilidades de conversa, que melhor mesmo a síntese e a cautela.
A fala forte da Cleusa levanta um tema caro, a psicanálise no Sistema Único de Saúde, que foi a deixa para envolvidos e interessados. Vários analistas contam sobre ricos e implicados trabalhos nos mais diversos contextos (hospitais, comunidades, elevadores, ruas).
A psicanálise se constrói a partir de uma ética e um fazer, o espaço que contorna é produzido no interior do analista.
A pandemia atualiza empiricamente essa ideia, e nos acrescenta o desafio de escutar, por meio e para além da tecnologia.
Entre ruídos e instruções de informática, vão se costurando os artigos.
Lila problematiza o atravessamento do diagnóstico médico, tema que conversa com o trazido por Ana, que acertadamente pergunta “o que entendemos por Psicanálise?”, convidando-nos a pensar profundamente sobre nosso ofício.
No fio também está a epidemia de autismos, acrescenta Adela, como estarão essas pessoas em um momento como esse?
Vera atenta para o lugar da interdisciplinaridade nos tratamentos.
Momento bonito, fomos tocados pelo relato do trabalho de Elina com moradores de rua. O lugar do psicanalista é também o de zelar pelos Direitos Humanos.
Tendo sido cuidada por uma pessoa que atendia, ela se surpreende e questiona: aquele que dizemos ser carente, é carente de quê?
A Psicanálise como prática civilizatória, enfatizam vários comentários.
No contato humano do atendimento, é preciso uma terceiridade implicada com o mundo social e político. Vale repensar a abstinência, pontua David.
A abstinência que faz sentido é aquela que respeita a alteridade, não a que retraumatiza o sujeito.
Pululam as contribuições e Renato sugere prorrogação, já que não teríamos o corredor e o estacionamento do Sedes para, como de costume, seguir a discussão.
Cita a resenha de Janderson, sobre o analista implicado, tão oportuno.
Antonieta fala sobre como trabalhar com o trauma, Cristina aproxima a psicanálise da poesia, tão atual.
Falas preciosas vão compondo uma vastidão de experiências, marcadas pelos percursos dos participantes.
Mesmo sem ser nomeado, ressoa o debate contemporâneo sobre o “lugar de fala”, e o que isso nos diz dos tempos atuais.
Uma gama enorme de questões teóricas, clínicas e políticas se originam nos textos e compõem a conversa. Outras tantas estavam lá, e poderiam ter sido linkadas.
Como as palavras de Fabio Landa que, em nossas associações, foram lembradas tantas vezes.
Dentre seus aportes, está a delicadeza e a potência do que acontece quando humanos se comunicam, se reconhecem, se validam, se vinculam e se cuidam.
Belo debate!
LINKS DE INTERESSE
Abstinência. Por Ana Maria Sigal: http://www.seer.unirio.br/index.php/psicanalise-barroco/article/view/9481
Os dispositivos e o atual. Por Janine Puget: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0486-641X2010000200006
O direito e a psicopatologia para a saúde pública: estratégias participativas na educação, no trabalho e na justiça. Por David Calderoni: clique aqui para ler
Projeto da Clínica do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae – Fundamentos, objetivos, princípios, atividades. Por Clarissa Silbiger, Joelle Gordon, Maria Alípia de Salles Guimarães, Maria Antonieta Whately, Maria Auxiliadora de Almeida Cunha Arantes, Maria de Fátima Vicente e Maria Silvia Bolguese: http://revistapercurso.uol.com.br/pdfs/p03_cronica.pdf
História do Departamento de Psicanálise: Projeto Clínica de Psicanálise e Projeto Clínico-Ético-Político: uma clínica social no Sedes. Por Departamento de Psicanálise: clique aqui para ler
Projeto Clínico-Ético-Político da Clínica Psicológica do Instituto Sedes Sapientiae. Por Instituto Sedes Sapientiae: clique aqui para ler
[1] Psicóloga e psicanalista clínica. Aspirante a membro do Departamento de Psicanálise do Sedes Sapientiae. Membro do Grupo Brasileiro de Pesquisa Sándor Ferenczi.
[2] Psicóloga pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Filósofa e Mestre em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo. Trabalhou com ajuda humanitária de 2006 a 2017 e atua no Sistema Único de Saúde desde 2012. Atualmente está na Assessoria Técnica de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo.