NANCI DE OLIVEIRA LIMA e MÁRCIA BOZON[1]
Aconteceu em junho no Instituto de Psicologia da USP o II Encontro Internacional do Grupo de Trabalho Psicanálise, subjetividade e cultura contemporânea com o tema Modalidades de pesquisa em psicanálise: métodos e objetivos, sob a coordenação dos professores doutores Leopoldo Fungêncio e Daniel Kupermann, ambos coordenadores de programas da pós-graduação da USP. Este evento ocorre anualmente e é uma iniciativa da Associação Nacional de Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP), no qual se discutem os trabalhos de pesquisa realizados por todos os que são associados à ANPEPP ao longo do ano anterior.
A ANPEPP é uma associação inter-regional e o encontro contou com a participação de pesquisadores de 5 estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além da conferência de abertura proferida pelo Prof. Dr. Christian Hoffmann, da Paris 7, que foi apresentada por videoconferência, pois ele não pode estar presencialmente.
Nós do Conselho de Direção - gestão 2017/2018 – achamos muito interessante a realização de um evento aberto e gratuito trazendo como proposta o debate de um tema tão relevante e atual como a pesquisa em Psicanálise, de forma que decidimos comparecer para acompanharmos de perto os debates sobre a questão da pesquisa em psicanálise nos meios acadêmicos.
As várias mesas redondas que compunham o evento foram organizadas em torno da discussão dos seguintes temas: aspectos estruturais da pesquisa em psicanálise; aspectos epidemiológicos dos modelos e métodos de pesquisa em psicanálise; potencialidades da pesquisa em psicanálise na Universidade; pesquisa clínica e pesquisa acadêmica em psicanálise; o uso de casos clínicos e outros materiais similares para pesquisa em psicanálise.
Foram três dias intensos de discussões e debates que suscitaram várias questões instigantes, tais como: o que significa método psicanalítico de pesquisa? Há um outro meio que não a clínica para orientar o psicanalista pesquisador? Como estabelecer relações entre a psicanálise e outras disciplinas? Como se dá o trânsito entre o processo primário e o processo secundário para o psicanalista pesquisador? As possíveis relações entre Psicanálise e Arte, etc.
Ilustrando o interessante material de pesquisa produzido pelos participantes destacaremos o trabalho apresentado pela Profª Drª Simone Perelson (ECO, UFRJ) intitulado: Interrogando o sexo ou interrogados pelo sexo?, no qual a autora desenvolve uma pesquisa junto a casais que recorrem a processos de fertilização assistida. Como uma das questões encontradas ela aponta a cisão entre reprodução e sexuação, destacando que no eixo da reprodução há um deslocamento do ato sexual fecundo para o ato técnico eficaz, tornando o sexo desarticulado do desejo sexual inconsciente e transformando-o em atividade intencional. A autora busca problematizar e compreender os atravessamentos existentes a partir desta questão.
O trabalho apresentado pelos pesquisadores Prof. Dr. Júlio Sergio Verztman (UFRJ) e Profª Drª Fernanda Pacheco Ferreira (UFRJ), intitulado Pesquisa clínica em psicanálise: descrição de uma ferramenta metodológica também chamou nossa atenção pelo método de pesquisa empregado. Os autores coordenam um grupo de vinte pesquisadores psicanalistas desenvolvendo um estudo comparativo de casos clínicos múltiplos, no qual buscam minimizar a interferência da pesquisa sobre a clínica. O projeto se propõe a receber pacientes que chegam ao serviço espontaneamente a partir de cartazes espalhados pelo campus da universidade. Os autores forneceram como exemplo sua penúltima pesquisa, na qual a chamada contida nos cartazes trazia a pergunta: Você sofre de fobia social? O critério de inclusão não está apoiado em nenhum diagnóstico, mas sim em como tais sujeitos se nomeiam. Recebem as pessoas que se apresentam e os atendem em análises individuais longas (de quatro a cinco anos). Deste grupo de analistas pesquisadores três supervisionam os atendimentos em supervisões grupais nas quais o material clínico é preservado através de anotações. Após um longo processo, este grupo se debruça sobre o material destacando as questões a serem investigadas. Na pesquisa com os fóbicos sociais, por exemplo, um dos eixos de pesquisa destacado foi a relação entre fobia social e a melancolia, que saltou aos ouvidos dos pesquisadores pelo modo oposto pelos quais ambos lidam com a vergonha.
O evento foi encerrado com uma conferência do Prof. Dr. Joel Birman, intitulada Politica e pesquisa em psicanálise.
Pudemos perceber como as questões discutidas pelos pesquisadores acadêmicos são próximas das que nos inquietam, pois giram em torno do estabelecimento de métodos, instrumentos e caminhos que nos possibilitem desenvolver pesquisas que contemplem a pluralidade dos aspectos presentes numa aproximação dos fenômenos pelo olhar e pela escuta psicanalítica.
O evento despertou nosso desejo de articular um diálogo sobre a pesquisa em psicanálise fora e dentro dos meios acadêmicos. Quem sabe num evento do Departamento no próximo ano?!
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[1] Psicanalistas, membros do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, articuladoras no Conselho de Direção.