PELO NOSSO OLHAR
Denise de Sousa Feliciano
Eixo temático – O TRABALHO DE REPRESENTAÇÃO
RESUMO
Nossa primeira troca de olhar foi impactante. Senti medo. Seus grandes e intensos olhos não estavam inquietos por um suposto estado de angústia. Pareciam entre um vazio e um desamparo que buscavam desesperadamente por um foco no qual pudessem se sustentar. É como se seus olhos tivessem chegado antes dele, se antecipando em pedir socorro. O momento inaugural do encontro com um analisando é como um lampejo iluminador sobre seu estado mental e que contribui ricamente para as conjecturas que se seguirão.
O relato da análise de Eric - uma criança de 6 anos que chega a uma analista pelo desespero de sua mãe de quem ele não podia se afastar sem sofrimento -, é o fio condutor do qual a autora se vale para abordar as vicissitudes de um trabalho sintonizado com a natureza de estados mentais primitivos. As condições incipientes de simbolização convocam a mente auxiliar do analista como um modelo para a capacidade de representar e construir narrativas fundamentadas por suas próprias associações. Freud em 1937 já fizera menção a esse manejo clínico afirmando que a proximidade permite ao analista restaurar as lacunas com sentidos que possam servir ao movimento do aparelho psíquico - representar.
Por motivo de mudança de país a análise tem a curta duração de cinco meses. Mesmo assim, o surpreendente potencial da criança somado à escuta atenta da analista, que adota um manejo clínico pautado pelo não-verbal, permite que se desenvolva um processo analítico de vínculo intenso, com mudanças significativas na capacidade interrelacional da criança e visível melhora das angústias de desintegração e desamparo, próprias dos estados primitivos da mente. Os recursos sensoriais, como o olhar, adquirem relevância na comunicação e interação analista- analisando para aos poucos se constituir numa mente mais estruturada pelo simbólico.
PALAVRAS-CHAVE: Psicanálise com crianças, mente primitiva, técnica, interpretação
Denise de Sousa Feliciano, Psicóloga e Psicanalista, doutora em psicologia do desenvolvimento pela IPUSP/SP, com especializações em Psicopatologia do Bebê pela Université Paris 12/USP e Psicanálise com Crianças pelo Sedes Sapientiae; membro do Depto de Saúde Mental e de Aleitamento Materno na Sociedade de Pediatria de SP; Membro filiado na Sociedade Brasileira de Psicanálise