|
Resumo
A PSICANÁLISE DE MAX
Autor: Nélio Wanderley do Sacramento
Medico Psiquiatra. Psicanalista. Membro Associado da Sociedade Brasileira de
Psicanálise de São Paulo.
Trata-se da experiência de trabalho com um menino de 11 anos, iniciada há 8
meses atrás. O trabalho prossegue até os dias atuais. Durante aproximadamente 3
meses, as sessões com Max foram marcadas por extraordinária turbulência. Não
houve, nesses terríveis inícios, aquilo que chamamos uma conversa. Era
impossível estabelecer qualquer contacto verbal. Toda a minha força e energia
se concentravam unicamente na tarefa extenuante de contê-lo fisicamente.
Entrava na sala de análise sempre de modo violento; irrompia é a imagem que
me ocorre como um touro furioso e cego. Ele parecia não ver o que havia em
sua frente e entrava no consultório gritando e investindo contra mim de modo
extremamente violento e quase insuportável: queria a todo custo e muitas vezes
conseguia pisar no meu pé com toda força, às vezes rindo desbragadamente ou
visava meu rosto e genitais. Quanto a esses alvos não parecia cego; ao
contrário, a mirada era certeira. Limitava-me e a segurá-lo fisicamente, era
preciso muita força de minha parte a fim de que eu me protegesse de seus gestos
insanos e desesperados. Era angústia em alto grau. Quando ele não me atingia
com tentativas de socos e pontapés eu conseguia manter-me a certa distância
ele lançava grandes e certeiras cusparadas das quais me desviava; era
necessário colocar-me fora da possibilidade de socos e pontapés. Algumas vezes
o cuspe atingiu-me em pleno rosto. Além disso, introduzia o dedo no ânus e
insistia sorridente, para que eu o cheirasse. A situação era insustentável e eu
pensei em interromper o trabalho. Eu tinha medo. Pareceu-me insensato dar
prosseguimento à análise naquelas condições. Tomei providências de ordem
práticas, adaptando o consultório para aquela circunstância extraordinária. O
que possibilitou o prosseguimento foi o fato de que ele dormia durante algum
tempo. Como que extenuado, desabava no divã e dormia. Isso me permitia
descansar e esperar. Não tomou conhecimento da caixa. Num certo momento, forcei
para que ele visse a caixa e os brinquedos. Após algum tempo, interessou-se
pela bola e começou um jogo de futebol enlouquecido comigo. Finalmente,
resolveu fazer uma bola de fita crepe e quis jogar com essa bola confeccionada
por ele. Mas o jogo rapidamente se transformou em tiro ao alvo eu era
naturalmente o alvo. Eu então interrompia a brincadeira quando a violência era
extrema. Ele vagava pelas salas do meu consultório e pelos corredores do
prédio, erraticamente. Insisti para que ele se sentasse e comecei eu mesmo a
brincar com massinha, a fazer alguns desenhos, aviões e barcos de papel,
esperando que ele me acompanhasse. Não se interessou, aparentemente. Até que,
certo dia, de modo surpreendente, sentou-se e conversou comigo, colocando as
mãos na cabeça e dizendo que escutava uma música sertaneja o tempo todo e
explicou que uma voz, em meio a música sertaneja, lhe dizia que eu pretendia
envenená-lo.
A análise tomou outro rumo, desde então: não pensei mais em desistir. A
violência se amainou.
De um ponto de vista conceitual ocorreu-me ou melhor, eu penso que vivi
aquilo que Melanie Klein descreve como o auge do sadismo, sobre o qual pretendo
tecer considerações, como também algumas idéias de Wilfred Bion.
|
|