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Resumo
COMPULSIVIDADE E CONSUMO NA INFÂNCIA
Autor: Pedro Luiz Ribeiro de Santi
Psicanalista. Doutor em Psicologia Clínica. Professor da Especialização em
Teoria Psicanalítica da COGEAE/PUC-SP. Professor e pesquisador do CAEPM da
ESPM.
Este trabalho pretende explorar um tema urgente na cultura contemporânea: a
compulsão ao consumo na infância.
Três crianças assistem um canal de TV a cabo na casa de uma delas. No
intervalo, passa uma série de comerciais de brinquedos. A cada propaganda, as 3
começam a gritar: eu quero, eu quero, eu quero! O que mais chama a atenção
nesta cena é que elas gritam rindo, sem nem olhar direito para tela, sem saber
bem do que se trata, sem guardar a lembrança daquilo que dizem desejar, sem
pedir por aquilo depois.
O excesso de oferta é tamanho que o desejo da criança não tem sequer a condição
de se configurar apegado a qualquer objeto. A pulsão não pode encontrar repouso
ou ligação em nada: ela entra num estado de deslizamento compulsivo. A criança
simplesmente quer; sem que haja algo capaz de simbolizar e conter este querer.
Temos aqui uma condição cultural contemporânea - a onipresença do consumo-
geradora de compulsividade infantil.
O consumo tem figurado recentemente entre os psicanalistas como forma de
adicção. Os modelos mais clássicos de compreensão da compulsividade as
relacionam à masturbação e à voracidade. De alguns anos para cá, tem havido na
psicanálise uma tendência a substituir a dimensão pulsional na compreensão das
adicções por uma dimensão voltada à relação de objetos. As análises tem se
centrado na idéias de que as adicções seriam recursos defensivos. O encontro
com a dependência de um certo objeto ao qual é preciso reencontrar protegeria a
psique contra a dependência do outro humano, vivido como invasivo e tóxico.
Ao invés de termos pais capazes de produzir um continente e anteparo para a
criança no que diz respeito tanto às excitações internas quanto às externas,
temos pais mais invasivos. Ao não poderem estar disponíveis para seus filhos a
todo o momento, o que é natural e mesmo necessário, os pais em sua ansiedade
dispõem do recurso da tv para preencher os vazios dos filhos.
A função do brinquedo desaparece. Há quem considere que o regime do consumismo
compulsivo excluiria o registro do brincar. A descartabilidade dos objetos os
tornam inúteis para a função de transicionalidade.
A compulsão é o reino da ação. Alguém pode estranhar o fato de que as crianças
cheguem às escolas cada vez mais dispersas, com dificuldade de concentração em
atividades que requerem mais demora ou dedicação? Não parece inevitável a
proliferação de déficit de atenção?
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