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Resumo
UMA HISTÓRIA ANALÍTICA - UM MOVIMENTO PARTICULAR
Autora: Regina Maria Ferreira de Almeida
Psiquiatra, psicanalista, membro associado da Sociedade Brasileira de
Psicanálise a partir de 1992. Foi Psiquiatra concursada de Crianças do Hospital
do Servidor Público Estadual e Professora titular de Psiquiatria Infantil do
Curso de Psicologia da Faculdade Objetivo.
Clara é uma criança de 7 anos com sérios problemas, decorrente de uma
síndrome neurológica que cursa com hipotonia muscular. Tem dificuldades de
marcha, de controle dos esfíncteres e da articulação das palavras. Necessitando
ser acompanhada por vários profissionais especializados.
Durante sua história analítica, que dura quatro anos, tem freqüentado minha
mente dúvidas sobre o seu desenvolvimento emocional, em função de uma
organização predominantemente psicótico. Encontrar um sentido para seu jogo,
quando este existe, é difícil, e muitas vezes, apenas assinalo o que ali
acontece, em busca de uma aproximação. Mas Clara surpreende, e assim, certa vez
que não consegui entender o que ela conversava, vai até sua caixa pega a fita
crepe, gruda a minha boca e ordena que eu fale, fica claro para mim a sua
intenção de me falar do seu sofrimento e a indignação por não ser compreendida.
Então se torna uma Clara que ordena, comanda, chegando às raias da tirania.
Seguimos nossa história, surge um movimento particular. Clara fala sobre
assuntos desconexos, misturando informações de filmes com fragmentos de sua
imaginação e restos de conversas de sessões de meses atrás. Apesar do
desencontro dessas idéias, busca, ainda que de uma forma pueril, mostrar-se
esperta, sabida. Durante essa fala salta aos meus ouvidos a presença constante
de palavras como pedra e gelo, enquanto também vou me dando conta de uma experiência
endurecida, áspera e fria.
É isto que chamo de funcionamento psicótico. Em um referencial do pensamento
bioniano, falamos em realidade sensorial, objetos bizarros e elementos beta. Um
dos propósitos desse trabalho é discutir sobre a observação e desenvolvimento
desses elementos na clínica.
Nessa mesma sessão surge outro movimento particular, vejo uma Clara usando os
brinquedos de sua caixa, expressando através dos jogos, conflitos de amor e
ódio. Triste e falando baixinho. Mostra-se neste instante angustiada e solicita
que eu silencie. Não aceita que nomeemos o que ocorre. Fico ali, deixando
acontecer aquele contato silencioso e íntimo.
Serão esses os elementos que nos levarão a falar de realidade psíquica,
indícios de integração do bom objeto, elementos alfa e desenvolvimento da
função alfa? O outro propósito, e quem sabe o escopo principal desse trabalho,
será propiciar a discussão dos fatores que podem auxiliar o desenvolvimento da
realidade psíquica no trabalho analítico.
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