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Resumo

A TRANSMISSÃO PSÍQUICA GERACIONAL NA PSICANÁLISE COM CRIANÇAS

Autora: Tatiana Inglez-Mazzarella

Psicanalista. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, doutoranda e mestre em Psicologia Clínica pela PUCSP, autora do livro Fazer-se herdeiro: a transmissão psíquica entre gerações editado pela Escuta.


Foi no atendimento de alguns analisandos, especialmente crianças, que me deparei com algo da repetição através das gerações. Um sintoma dos filhos que levava os pais à consulta. Chamava-me a atenção no discurso desses pais algo que aludia acerca de um destino para seus filhos já traçado e previsto como repetição do destino deles, que por sua vez já repetiam também algo do destino de seus próprios pais. Algumas vezes isso era explícito, sem que, pudessem se escutar nesta dimensão da qual falavam, e, que, seus filhas/filhos apresentavam*, outras vezes isso aparecia, como mal-estar que rondava a sessão e marcava a escuta.

Freud já falava do filho como ilusão de continuidade diante do confronto dos pais com a mortalidade. As novas gerações seriam, assim, uma promessa de continuidade. Hassoun (1994)** chama a atenção para uma certa aparência natural da transmissão na qual a geração seguinte reproduziria as crenças, a língua, o jeito de viver para, paulatinamente, introduzir as novas aquisições. Contudo, segundo o autor, os fatos contradizem esta visão idílica da transmissão e da continuidade. Relembra Freud em seu texto  Resistências à psicanálise no qual destaca o caráter de estabilidade preciosa que o novo vem a ameaçar.

O tema da transmissão aponta para um duplo movimento: continuidade e ruptura. Para Hassoun (1994) uma transmissão bem-sucedida é mais que um paradoxo, pois seria aquela que ao oferecer um espaço de liberdade, permite ao sujeito que o passado seja  deixado para ser melhor reencontrado . Ou seja, deixar os pesares das gerações precedentes para reencontra-se com uma verdade subjetiva, uma conciliação possível entre a história passada e a verdade da existência do sujeito, o atual de seu desejo.

Este trabalho procurará trilhar este caminho paradoxal. Como alguém se constitui por meio de um outro sem ser tomado por esta história alheia? Como fazer uma história própria? Como se fazer herdeiro?

A discussão no campo da psicanálise com crianças do tema da transmissão psíquica geracional pode contribuir para ampliação da escuta de nossos analisandos, assim como trazer elementos para reflexão acerca do manejo.



* Apresentação aqui é um termo utilizado em oposição à representação. Enquanto atuação ou sintoma no corpo, algo que se dá a ver sem que seja simbolizado. ** HASSOUN, J. Les contrebandiers de la mémoire. Paris: Syros, 1994.