Comissão de Projeto e Pesquisa do Departamento Formação em Psicanálise
Proposta de trabalho para 2015 e 2016
Trazemos aos colegas o que pensa esta Comissão de Projeto e Pesquisa (CPP) que hora assume sua função no departamento.
Optamos por nos dedicar de início, a explicitar qual é para nós, o significado de ser um grupo que coordena projetos e pesquisas no campo da formação psicanalítica.
Fomos conduzidos a nos dizer que, a priori, teríamos que ser um lugar que refletisse a possibilidade de que o pensamento pudesse ser exercido em sua plenitude. Acreditamos que no exercício de sua publicação o pensamento vai encontrando o caminho que lhe é justo e que lhe cabe quando o pensar acontece dentro da instituição.
Como as condições que o pensamento encontra para ser gestado têm íntima relação com a atmosfera em que se encontra, o trabalho que esta comissão pretende implica em refletir a formação psicanalítica em nosso departamento e permitir a construção de possíveis reguladores dessa atmosfera que sejam, ao mesmo tempo, portadores de esperança e de compromisso com o desenvolvimento intelectual.
Refletir, tanto no buscar os fundamentos ideais para o exercício continuo dessa formação, como refletir a violação dos mesmos, ainda que todos nós saibamos que os fundamentos ideais constituem uma direção, não um lugar.
A seguir, tecemos algumas considerações sobre os princípios que nos orientam.
Este posicionamento se dá num momento em que reaparecem antigos sintomas de uma crise no próprio cerne da existência do departamento. Isto acelera a urgência de nos constituirmos em um lugar para pensar a razão de nossa existência e dos princípios que a norteiam.
Estabelecemos em nossas discussões que seria fundamental desenvolver a capacidade para a construção de um espaço que aprofunda a reflexão e questiona o aprendizado em psicanálise e suas direções de ensino, criando, a partir do que já temos um campo institucional para poder tirar as questões psicanalíticas do embate entre escolas e eleva-la à condição de uma metapsicologia da formação. Levantamos alguns pontos para serem constantes apoios de conversa e diálogo:
– o que é a formação em psicanálise?
– o que circula em uma formação é: divulgação de uma ‘ideologia’ ou um trabalho de estímulo ao ‘pensamento’? A relação que se estabelece entre os dois polos é a de professor/aluno ou entre a ‘do que transmite’/‘do que recebe’?
– Como se dá a transmissão no processo de formação? Como se estabelece uma relação de aprendizado se dela se elimina a relação professor/aluno no campo da formação?
– O lugar do transmissor é o de um adestrador ou de um provocador?
– Pensando a formação como um processo, como pode ser seu início, seu desenvolvimento clínico e seu aprofundamento, especialmente estendendo-se a reflexão até a questão da psicanálise leiga. Ou seja: quem é o leigo e quem é o não leigo?
– Temos conosco que psicanálise só se aprende em desamparo. De algum modo, ela é uma experiência adulta que não prescinde da companhia do outro, mas não pode ser reduzida a um tipo de contato escolar onde o nós que se constrói está lastreado na ilusão de que existe um grupo que me ama e dará amparo e autorização. O tornar-se analista é uma experiência adulta em que cada um deve ser capaz de sustentar a turbulência do aprendizado, sua solidão e a do outro.
– É necessário pensar a violência sempre presente no íntimo de todo aprendizado e não menos no da instituição psicanalítica e verificar quais alternativas existem que não a rivalidade.
– Sabemos das eternas discórdias e intrigas que perpassaram todas as escolas de psicanálise; sabemos que a instituição psicanalítica sofre ao tentar se transformar em um time. Talvez, não se possa chegar a isto, a esta meta coletiva justamente por causa da qualidade emocional que cada psicanalista desenvolve ao ser psicanalista. Talvez, seja mesmo muito complexa a reunião de pessoas em nosso campo. Porém, mesmo assim, e talvez por isso mesmo, não vemos outra saída que não a luta pela formação de um espaço onde só caiba a discussão de ideias e não do valor ou qualidades do orador.
– Não esperamos construir uma integração das pessoas, mas almejamos erguer um telhado que acolha toda a complexidade da formação em psicanálise que nos é tão específica e particular.
– Assim, diante disto que apontamos, propomos que seja instituída pela direção do departamento, e mais uma vez na história da psicanálise, uma nova fase de CONTROVÉRSIAS TEÓRICAS.
Entendemos isto como abertura de um território onde se discuta estritamente no campo das ideias, as diferenças epistemológicas entre Freud, Klein, Winnicott, Lacan, Bion.
Simultaneamente a estas CONTROVÉRSIAS TEÓRICAS, gostaríamos também de convocar o grupo para as CONTROVÉRSIAS CLÍNICAS. Este deve ser o ponto de partida da eterna questão sobre o par transferência e contratransferência.
Gostaríamos de ver nossa proposta discutida por este conselho.
Caso seja aprovada, nos comprometemos a apresentar um roteiro mais pormenorizado para início dos trabalhos.
Desde já fazemos uma sugestão para a realização de evento com Mássimo Recalcati, psicanalista italiano, para o segundo semestre de 2016, a depender de sua possibilidade de aceitar participar.
Para introduzir algo do pensamento do autor:
“A defesa da psicanálise é a defesa de uma ética da responsabilidade e de uma teoria crítica da sociedade da qual ainda hoje temos uma grande necessidade (…) louvar os elementos a meu ver, cruciais da experiência analítica, defender sua causa que não é só a causa da psicanálise stritu sensu, mas envolve também uma inteira concessão do homem que se sustenta na importância do pensamento crítico e no caráter particular e incomensurável do desejo subjetivo” Recalcati,M – Elogio dell’inconscio dodici argomenti in difesa dela psicoanalisi. Pearson Paravia Bruno Mondadori S p.A.. 2007 Udine. Pg XII.