Resumo
O conceito de saúde, à luz dos pensamentos de D. W. Winnicott (1896-1971, pediatra e psicanalista inglês), está intrinsecamente associado à possibilidade de viver os estágios de desenvolvimento emocional plenamente. Para que isso aconteça, é fundamental que um ambiente favorável circundante sustente o desenvolvimento do potencial herdado, que é inato. O potencial herdado está ligado à tendência no sentido do crescimento e do desenvolvimento (Winnicott, 1960/1990).
A base da teoria de Winnicott privilegia a mais tenra infância, pois para o autor é neste período que se inicia o desenvolvimento do ego, com a integração deste como principal aspecto, se tudo correr bem. O autor ressalta que é mais comum do que se imagina ocorrer uma cisão da personalidade a partir da interação com ambientes insatisfatórios, Winnicott (1950/2002):
Na forma mais simples de cisão, a criança apresenta uma vitrine, ou uma metade voltada para fora, construída com base em submissão e complacência, ao passo que a parte principal do eu, contendo toda espontaneidade, é mantida em segredo e permanentemente envolvida em relações ocultas com objetos de fantasias idealizados. (p. 199).
É relevante destacar a importância do cuidado materno que propicie o ambiente sustentador neste período, já que este é imprescindível para a saúde. De acordo com Winnicott (1960/1990), “o bebê e o cuidado materno juntos formam uma unidade” (p. 40). O autor refere-se aos primórdios do desenvolvimento em que o bebê apoia-se ao ego da mãe e vive a onipotência para gradativamente, a partir de continuidades desse cuidado e falhas maternas suportáveis, resultar em um “estado unitário”, uma pessoa com individualidade própria caso não ocorram intrusões ambientais prejudicando a continuidade do crescimento emocional.
A pessoa capaz de prover o cuidado materno satisfatório que auxiliará o desenvolvimento saudável do bebê é a chamada mãe suficientemente boa para Winnicott garantindo através de identificações com seu bebê o holding, ou seja, a provisão ambiental total. O conceito de holding inclui a rotina completa do cuidado, seguindo as mudanças instantâneas do dia-a-dia. Tal cuidado não é o mesmo para diferentes crianças (Winnicott, 1960/1990). Ou seja, um ambiente humano que se adapte às necessidades do bebê.
A fase de holding vai facilitar que o bebê caminhe em seu desenvolvimento partindo da dependência absoluta, em que o bebê não percebe o cuidado materno (o bebê ainda não é uma unidade, portanto está fundido à mãe), não podendo assumir controle do que é bem ou mal feito, logo, estando em posição de apenas se beneficiar ou sofrer as ações ambientais. Para assim, através de experiências favoráveis do cuidado materno, rumar à independência: tendo alcançado a condição de uma unidade, em que desenvolve meios para ir vivendo através do acúmulo de recordações do cuidado recebido (Winnicott, 1960/1990).
Winnicott (1950/2002) ressalta que a criança vitima de privação de um ambiente favorável no início de vida está doente: “isto porque a ação ambiental saudável favorece o desenvolvimento das potencialidades para a saúde do indivíduo” (Careta, 2011, p.24). O presente estudo visa frisar a importância de um ambiente humano favorável em instituições para o acolhimento de bebês, para que assim o desenvolvimento destas crianças possa ocorrer de forma plena, rumando à saúde mental. Para ilustrar a necessidade apontada, apresentamos um recorte de um caso clínico sobre um bebê institucionalizado.
O ambiente de holding fez-se imprescindível no ambiente psicoterápico, apontando para necessidade de manejo de setting. É importante ressaltar que os atendimentos aconteceram na instituição. Trata-se de nos adequar à realidade do contexto. Dessa forma o manejo de setting estabelece-se atrelado aos enquadres diferenciados (Careta, 2011)*.
* Segundo Careta (2011), “enquadres diferenciados podem sercompreendidos como settings alternativos, nos quais o método psicanalítico pode ser concretizado com rigor. Ver: Aiello-Vaisberg (2004), Ser e Fazer. Enquadres diferenciados na clínica winnicottiana.”
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