A sexualidade revisitada
por Helena Albuquerque[1]
O XI Congresso FLAPPSIP, sob o tema A sexualidade revisitada: novos cenários na teoria, a clínica e a época atual, foi realizado de 5 a 7 de novembro 2021, na modalidade virtual. O convite para revisitar a sexualidade decorrente de novos cenários na clínica, na escuta daquilo que se move socialmente e se impõe como questão para os sujeitos contemporâneos, fala de uma psicanálise atenta às profundas mudanças atuais nas identificações de gênero, nas relações amorosas, no desejo, nas práticas de filiação. Nos três dias do Congresso, foram colocados em cena (e na tela) e debatidos de maneira frutífera e densa: os destinos da sexualidade infantil hoje, as novas expressões de sexualidades, gêneros e sexuações, o impacto das tecnologias nos laços e práticas sociais e sexuais, as novas parentalidades, os possíveis incômodos da psicanálise com a dissidência sexual e os modos de apresentação do sofrimento contemporâneo. Houve também a apresentação do resultado de uma pesquisa realizada em conjunto pelas associações da FLAPPSIP, relatada aqui nesse boletim por Maria Aparecida Barbirato.
As apresentações de Silvia Leonor Alonso: A construção de um diálogo, psicanálises e feminismos e de Fátima Vicente: Espaço virtual, corpo e passagem ao ato, ambas excelentes, contribuíram de forma valiosa para as discussões que se seguiram nas mesas. No Concurso estudantil Dr. Jorge Rosa venceu a aluna do Curso de Psicanálise Isadora de Vilhena Barreto e recebeu uma menção o aluno do mesmo curso, Luís Henrique de Oliveira.
Todos os trabalhos apresentados no Congresso estão publicados na Revista FLAPPSIP Intercâmbio Psicanalítico, Vol X, n. 2 / Ano 2021, que se encontra no site da FLAPPSIP (flappsip.com).
O que me surpreendeu muito positivamente, para além da excelente qualidade dos trabalhos apresentados, foi a vivacidade e a profundidade dos debates realizados nas diversas mesas pelos participantes. Foi um encontro extremamente produtivo e dinâmico, conduzido de forma muito atenciosa e amigável pelo presidente da FLAPPSIP, Facundo Blestcher.
A surpresa talvez tenha vindo da decepção inicial pelo fato de que seria um congresso virtual. A frustração era grande por não ser possível, devido à pandemia, o encontro ao vivo em Buenos Aires entre os amigos e colegas do Departamento e das outras associações do Brasil e com os colegas e amigos dos outros países latinoamericanos. Andar, nos intervalos e antes ou após o Congresso, pelas charmosas ruas de Buenos Aires, com seus muitos cafés, entrar nas indispensáveis livrarias portenhas, dar um pulo no Malba, junto com antigos e novos amigos e em meio às conversas sobre os temas e as discussões realizadas, seria imprescindível! Como não pensar em terminar a noite em um restaurante portenho apreciando o vinho, celebrando o reencontro, as trocas e a riqueza dos trabalhos apresentados?
Contudo, é evidente que as idas presenciais aos congressos em Buenos Aires ou em outra cidade implicam numa divisão maior entre os vários objetos de desejo. Constatei com prazer, nesse XI Congresso FLAPPSIP, que um congresso pode ser bastante interessante e proveitoso na modalidade virtual. O investimento e atenção mais exclusivos no programa, nas apresentações, na escuta dos trabalhos e na participação nas discussões podem fazer com que esses ganhem em consistência e produtividade, me parece. Ou pelo menos foi o caso comigo!
Nessas considerações fica evidente que gosto e conheço um pouco Buenos Aires, mas não se trata só de Buenos Aires… Estou na expectativa de que o próximo congresso FLAPPSIP seja presencial em Santiago do Chile. Estar em um país estrangeiro, ouvir e tentar entender e falar outra língua convoca e convida à uma abertura para o outro e para a alteridade. Implica em deixar-se afetar pelo estrangeiro, pela diferença, pelo heterogêneo da outra cultura, ao mesmo tempo em que favorece o estreitamento de laços de amizade entre aqueles que se encontram. Em um congresso da FLAPPSIP podem se enlaçar na amizade os psicanalistas brasileiros, chilenos, peruanos, uruguaios e argentinos, dando lugar às identificações e ao compartilhamento do que temos de diferente e em comum, podendo render novas e criativas produções teórico-clínicas.
Como testemunhei acima, isso também pode acontecer nos encontros e trocas virtuais, mas creio que de forma menos intensa, estando cada um de nós em sua própria casa, rodeados do familiar. Tudo se potencializa quando os encontros e trocas acontecem ao vivo. Faz diferença quando os corpos se deslocam em uma cidade estrangeira, “se a alma não for pequena”. Sabemos o quanto a experiência do estrangeiro é importante na psicanálise e para cada um de nós psicanalistas, para além do sentido nacional e legal do termo.
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[1] Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, integrante do grupo O feminino e o imaginário cultural contemporâneo.