Instituto Sedes Sapientiae

boletim online

jornal de membros, alunos, ex-alunos e amigos de psicanálise

Fala Sedes

por Anderson Pedrini[1]

 

“Fala Brasil, fala pelas urnas, dizendo que teu povo inteiro quer
eleição como sinônimo da verdadeira revolução;
Fala Brasil, fala pelas urnas, dizendo que teu povo é muito ordeiro,
mas que não é cordeiro…”
Trecho da intervenção de Madre Cristina – campanha das Diretas Já, 1984)

 

Começo esse breve texto compartilhando o que venho escutando de forma recorrente e potente nas últimas semanas e em especial nos últimos dias: essa é a eleição mais importante de nossas vidas. A frase, de fato impactante, traz consigo um merecimento que assumo ter acordo. Sim, essas eleições possuem uma centralidade para a vida, a minha vida, nossas vidas, a vida da democracia brasileira.

Quando penso e cito a palavra democracia me vem o tamanho e significado dessa palavra para nós, povo brasileiro. Historicamente, em nosso país, democracia não é algo dado. Democracia em nossa história tem a ver com disposição, organização, luta e uma conquista que sempre – em momentos de acirramento das disputas quanto aos rumos de projetos de país – é colocada em risco, assim foi em outros momentos de nossa história. Também assim convivemos pelo menos pelos últimos 4 anos, de forma recorrente.

A sanha antidemocrática que vemos no dia a dia, além de ter nome, sobrenome e endereço, tem projeto para o país – ou poderíamos até chamar de anti-projeto de país, porque cada dia se torna mais óbvio o quanto é anti-povo, o quanto vê as imensas riquezas como mercadorias a serem saqueadas, o quanto articula para que nossas empresas estatais sejam cada dia mais entregues/privatizadas e a força do trabalho sofra com um ainda maior grau de exploração através de tantas medidas que sucateiam as nossas já frágeis leis trabalhistas, provocando assim um cenário profundo de insegurança, instabilidade e, por consequência, empobrecimento de nossa nação.

Querem impor goela abaixo que são os verdadeiros bastiões da bandeira verde e amarela, mas fingem não ver que, nesse verde amarelo hoje, pelo menos 36% dos brasileiros e brasileiras, segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas[2], passam pela chamada vulnerabilidade alimentar, ou seja, concretamente não sabem se irão garantir na mesa as três refeições básicas ou se dentro dessas refeições terão os itens mínimos necessários para uma alimentação digna, índice que, segundo os pesquisadores, aponta recorde histórico. É um quadro resultante dos que pensam nessa bandeira nacional apenas como slogan, mas que gostam de escrever Brasil com Z.

Falar e lutar pela bandeira da democracia neste instante de nossa história ultrapassa as barreiras do processo eleitoral. Democracia neste instante significa a construção da possibilidade de dialogarmos sobre os rumos de nosso país, de construir esses diálogos sem ter medo de violências constantes e cada vez mais graves. Aliás, não sobram dúvidas de que toda essa lógica da violência imposta vai no sentido de construir uma negação da política. O medo se sobressai frente ao diálogo, assim se enfraquece a disputa saudável e necessária que mora na essência da vida política.

No campo das batalhas democráticas da história brasileira creio ser fundamental estabelecermos a relação com o espaço do Instituto Sedes Sapientiae. A história do Instituto Sedes se confunde com a história da defesa da democracia e liberdade em nosso país. Democracia é uma palavra e uma luta que está na fundação, na concepção, na carta de princípios, está no gene e certamente em um legado que ano após ano é reavivado, reanimado por tantos e tantas.

No campo da preocupação com o cenário colocado nos últimos anos, somada à avaliação de mantermos de forma orgânica o legado democrático do instituto, criamos a experiência do grupo Fala Sedes que, desde 2018/2019, possui o intuito de juntarmos aqueles e aquelas que compõem a chamada comunidade Sedes, ou seja, aqueles que estudam, que ensinam, que trabalham, que frequentam, em suma, os que possuem algum vínculo ou ponte com a instituição, para que possamos falar, escutar, propor e planejar ações que visem intervir concretamente nesse momento que consideramos tão fundamental na vida democrática brasileira.

Um episódio recente, tão simbólico, foi a participação no importante ato em frente à Faculdade de Direito no largo São Francisco. Preparamo-nos com faixas, cartazes, palavras de ordem e lá estávamos, no meio de uma multidão, de forma organizada, colocando a nossa voz, nosso legado e nossa história em pleno movimento, de forma viva e ativa marcando presença e disposição em conjunto com outras centenas de coletivos, partidos e movimentos populares. A energia dos participantes, a leitura da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!”[3] foram momentos fortes de demonstração da resistência de um amplo leque de organizações da sociedade civil frente a qualquer ímpeto golpista.

Entendemos que vamos por mais. É preciso dialogar para dentro e para fora do instituto. Construir nesse momento uma ruptura com a inércia da instabilidade política que nos assola, recuperando o que o poeta amazônida Thiago de Mello já nos dizia: “É tempo sobretudo de deixarmos de ser apenas a solitária vanguarda de nós mesmos”. Como dizem: é preciso extrapolar as nossas “bolhas”, ampliar o diálogo com os divergentes, ocupar os possíveis espaços da mensagem política, ter iniciativas e criatividade que a dinâmica atual nos exige, ocupar as redes e as ruas.

Montando bancas de materiais pela democracia, construindo sarau com música, poema e debates e principalmente ocupando a cidade, ecoando a nossa voz aos quatro cantos.  Nessa trajetória pode-se acertar, pode-se errar, mas deixar de fazer, deixar de agir, certamente não é uma opção.

 

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[1] Educador do CEPIS, aluno do 2º ano do curso Clínica Psicanalítica: Conflito e Sintoma do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae.

[2] https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/inseguranca-alimentar-no-brasil-cresce-na-pandemia-e-atinge-maior-patamar-da-historia/

[3] https://direito.usp.br/noticia/3f8d6ff58f38-carta-as-brasileiras-e-aos-brasileiros-em-defesa-do-estado-democratico-de-direito

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