Instituto Sedes Sapientiae

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jornal de membros, alunos, ex-alunos e amigos de psicanálise

Roda Viva

por Nanci de Oliveira Lima[1]

 

Ontem vimos nascer uma associação de psicanálise.

Nasceu depois de longa gestação e muito trabalho de todos que fundaram e compõem a Associação Roda de Psicanálise – Teoria, Clínica e Cultura, da cidade de Maringá, Paraná.

A Roda chegou se definindo pela comunhão das diferenças, pelo gosto do conflito. Aquele, o bom conflito, que anda fazendo falta em tempos de impossibilidade de diálogo.

Houve festa, houve música, poesia e microfone aberto para quem quisesse fazer uso da palavra. E nós, três colegas do GTEP, pudemos fazer parte deste momento.

João Rodrigo Oliveira e Silva e eu, que estamos coordenando seminários de percursos de formação, fomos convidados para estar presente e, dessa forma, a festa foi marcada para uma data oportuna, na qual estaríamos na cidade. Infelizmente, Silvia Ribes, que também coordena um seminário, não pode comparecer.

Já Fátima Milnitzky estava lá por um motivo especial. Ela, como “madrinha” da Associação, recebeu a homenagem de Membro Honorário da Associação. Ronise Basaglia, representando os associados, lhe disse belas palavras, ressaltando o quanto sua presença impactante foi – e é – inspiradora e instigadora do desejo de cada um. Por sua vez, Fátima nos presenteou com uma fala espontânea, na qual ressaltou “a importância destes psicanalistas fazerem sua inscrição nos territórios da psicanálise, comungando um sonho comum de uma possível feminização da Ágora, com uma pólis mais simpática às diferenças, às práticas de hospitalidade e políticas de amizade”.

Foi gostoso relembrar que a Roda surgiu a partir do empenho de três amigas que buscavam um espaço de troca entre os pares, mas que, na falta de se identificar com as instituições já existentes na região, decidiram fundar sua própria.

Começou tímida, em idos de 2013, buscando parcerias com quem pudessem seguir em formação e, assim, chegaram ao GTEP. Foram dois anos de articulação antes de se iniciar a primeira turma de analistas em percurso de formação básica conosco. Neste período, houve muitas interrogações provocativas feitas por Leonor Rufino, que se manteve em diálogo com elas, sustentando a tensão enquanto este desejo de parceria era melhor compreendido e estruturado por Isabelle Maurutto, Aline Sanches e Samara Megume. Lembro-me de Leonor, numa reunião geral do GTEP, lendo a carta de proposição de parceria escrita por elas e da alegria que senti ao perceber ali coerência e implicação, além de muita pulsão de vida — necessária para a empreitada a que se pretendiam.

Do lado de cá já se desenhava um princípio de retaguarda para a localidade – forma como estruturamos as trocas entre nós do GTEP. Elcio Gonçalves e Fátima se juntaram à Leonor e rascunharam, junto a ela, caminhos para mantermos contato, numa época em que o GTEP esteve impossibilitado de iniciar trabalhos em novas localidades e a Roda ainda não agrupava um número mínimo necessário para abrir seleção para um percurso de formação.

A alternativa encontrada foi, a cada dois meses, um dos que compunham a retaguarda naquele momento se deslocar até Maringá para uma palestra aberta, com temas psicanalíticos de interesse mais geral. As palestras eram para um público amplo, incluindo alunos em graduação de psicologia das faculdades locais e outros interessados. Desse modo, a Roda foi se fazendo conhecer na região e definindo no campo uma forma específica de pensar e fazer a psicanálise, que se alinha com a de nosso Departamento. Em paralelo a estes eventos abertos, também aconteciam encontros fechados, para um grupo que já se aproximava da Roda, com os quais a discussão teórico-clínica com o GTEP se iniciava. Ocorriam em um formato diferente do que fazemos usualmente nas localidades, mas funcionaram como pilares de sustentação da parceria desejada.

Uma década depois, ou quase, temos três grupos em percurso de formação com o GTEP (dois de Formação Continuada, após o percurso de Formação Básica e um que iniciou o percurso de Formação Básica este ano; parte deste grupo esteve num módulo de Introdutório Clínico, acontecido no ano passado).

Além da parceria com o GTEP, a Roda já organizou minicursos e ciclo de palestras com convidados que ocupam lugar de referência no campo psicanalítico nacional, além de grupos de estudo e grupos de supervisão coordenados por eles. No próximo mês inauguram um grupo de literatura e psicanálise e, recentemente, participaram de um evento significativo em defesa da Psicanálise leiga, que uniu as entidades psicanalíticas existentes na região, por conta de um possível bacharelado em psicanálise ofertado por uma faculdade local. A Roda segue ampliando seus círculos.

O desejo de se organizar como uma Associação surgiu após um tempo de Supervisão Institucional, na qual perceberam a necessidade de mais braços para fazer a Roda girar.

Entenderam que já era tempo de deixar entrar mais pessoas, tão implicadas quanto elas, e, para isso organizaram reuniões com parceiros que também estiveram nos percursos de formação com o GTEP, batizando de “Devires” estes encontros. Nos Devires desenhou-se a estrutura de funcionamento da Associação, agora inaugurada.

Para o GTEP isso é motivo de grande alegria. Temos como um dos propósitos que nos norteia, além da difusão da psicanálise e do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae Brasil afora, a intenção de mobilizar nossos parceiros nas localidades a construírem uma relação com o território e com a psicanálise que prescinda de nós.

Roda mundo, Roda Gigante, Roda-moinho, Roda Associação. Nem sempre a roda viva carrega nossas roseiras pra lá. Às vezes, algumas rodas nos ajudam a semear a esperança de seguir construindo e partilhando mundos possíveis.

Vida longa à Associação Roda de Psicanálise!

Outubro/2022

 

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[1] Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, integrante da equipe editorial deste boletim online, do GTEP e da Comissão de Admissão.

 

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