O espaço clínico: breve testemunho de um aprimorando[1]
Raphael Rodrigues Martins[2]
Estar na Clínica social do Sedes tem causado mudanças na minha clínica psicanalítica. Acredito que a escuta tem se ampliado e se complexificado a cada supervisão e a cada reunião clínica, aprimorando, assim, o processo analítico e o projeto terapêutico da pessoa atendida. Penso que isso vem se dando pela troca com diversos profissionais (psicanalistas, psicopedagogas, psiquiatras, assistentes sociais…) da área da saúde mental.
É interessante perceber a ampliação e as diferentes interpretações que surgem nos diversos espaços de discussão em grupo. Essas diferentes leituras podem estar alinhadas ou não – e, em alguns momentos, podem ser até conflitantes.
Agora, é preciso considerar que cada espaço tem a intenção de ter a sua especificidade e seus focos.
Quando levo um caso para a supervisão, é comum que as perguntas e a análise transitem pela subjetividade. Interessa a escuta do sujeito, as manifestações do seu inconsciente e como se dá a transferência. São comuns as seguintes perguntas: Qual é a história do sujeito? De que fala o sintoma? Qual lugar o analisando ocupa na família? Como se dão suas relações familiares? O que se repete? Ele tem sonhado? Com o que tem sonhado? Como a interseccionalidade (raça/classe/gênero/território) atravessa o caso? Ele entrou em análise? Tem transferência? Como se apresentam os fenômenos transferenciais? Como a transferência institucional incide no processo analítico? Que efeitos contratransferenciais estão presentes na situação analítica?
Já em uma reunião clínica, o caminho tomado pode ser outro ou paralelo. Geralmente, as perguntas, hipóteses ou afirmações são: Aqui consta no prontuário que no primeiro processo a demanda principal era… Ele continua sendo consultado por um psiquiatra? Qual remédio está tomando? Acho que podemos conversar com a assistente social para pensar se consegue pleitear algum benefício do Estado. Ele era assim quando chegou na equipe e parece que agora está desenhando outra história. Sua mãe também é acompanhada aqui e parece que a paralisia do irmão causou mudanças em outros integrantes da família. Temos que avaliar a continuidade do caso aqui porque já é o terceiro processo dele.
Vejam que nas duas situações a subjetividade é considerada e questionada, mas avalio que a história do paciente na clínica institucional e as questões socioeconômicas são mais tratadas na equipe clínica e os processos inconscientes têm mais relevância na supervisão.
Como articular, levando em conta a ética, o que escuto em ambos os espaços?
Acredito que caiba ao aprimorando guiar sua escuta tanto a partir da função terapêutica quanto de sua função analítica, tanto no que se trata na reunião clínica quanto na supervisão. A dinâmica na clínica psicanalítica faz com que a escuta se torne uma escuta transferencial e do inconsciente. Questões institucionais e socioeconômicas certamente atravessam essa escuta, poder considerá-las é um ganho do aprimoramento e do analisando.
Esse texto não é só fruto da minha vivência, observações e reflexões com os colegas da Clínica, mas também de trocas diretas com: Andréa Favalli; Bruno Spadoni; Diego Pereira; Fabiana Gomes; Fabio Zanchi; Maiâna Maia; Paula Francisquetti.
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[1] Este texto corresponde à intervenção realizada no evento Espaço Clínico, realizado pelo Curso de Psicanálise em 15 de agosto de 2024.
[2] Psicanalista em formação no terceiro ano do Curso de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, do qual é aprimorando na Clínica Psicológica do Sedes.