Onde nos encontrar em dia de chuva – sobre o lançamento de Vermelho vivo de Déborah de Paula Souza
por Daniela Athuil[1]
Quando a palavra, desobrigada a dizer, faz poesia. Quando a linguagem mantém a relação com o mistério, e tudo diz. Déborah é palavra livre, língua misteriosa. Vermelho vivo, seu segundo livro de poesia, lançado em 27 de setembro de 2022, é pura fruição. Evento que permitiu encontros felizes de amigos na fila, à espera do abraço da poeta, ao abrigo do vento e da chuva, numa terça-feira molhada.
Mas não se engane. Vulneráveis que somos “à natureza alucinógena do amor”, Déborah não nos redime: “o esplendor e a morte já estão ali”. E é descendo o rio de Vermelho vivo, em sua correnteza ora mansa, ora estrondosa, que nos encontramos com jardelina, lispector, oxum, vênus, curandeiras, videntes, onças, diabos e tantos outros seres e mundos habitados por ela.
Possuídos de beleza incomum, o som, a imagem das palavras, o jogo de liberdade do pensamento, tudo isso chega ao leitor como refinada bruxaria:
“oh senhora que me deste
o dom desta vida inteira
e na receita de cura
puseste amor e brincadeira
me salva d’eu ficar triste
me poupa das minhas pompas
me deixa ser curandeira”
Como quem sabe o valor dos detalhes e traz o dom da delicadeza nos gestos, Déborah concedia ainda mais uma surpresa ao leitor, estampando ao lado de cada dedicatória, abelhas, corações e araucárias. Axé a essa escritora e amiga que trouxe alegria inédita em dia de chuva.
[1] Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, integrante da equipe editorial deste boletim online, do grupo de trabalho e pesquisa O feminino e o imaginário cultural contemporâneo e do grupo de intervenção e pesquisa clínica Da gestação à primeira infância.