terça-feira, 15 de dezembro de 2015 - 14h02

MANIFESTO em defesa do tratamento humanista e da Reforma Psiquiátrica
15 dez 2015

MANIFESTO em defesa do tratamento humanista e da Reforma Psiquiátrica

O Instituto Sedes Sapientiae lamenta a exoneração  no dia 10 de dezembro de 2015 do Coordenador Nacional de Saude Mental, Álcool e outras Drogas, Dr. Roberto Tykanori, incansável defensor das políticas humanistas do SUS na área da saúde mental.  O instituto tb recebe com preocupação a notícia da possível nomeação de um coordenador não alinhado  com a Reforma Psiquiátrica, instituída como política de Estado no Brasil. Consideramos fundamental a manutenção dos investimentos na rede de cuidados substitutiva aos manicômios e na construção da intersetorialidade na política de saúde mental e drogas. Ao contrário dos manicômios, estas são políticas públicas dignificantes e subjetivantes que trabalham na direção da construção da cidadania e de uma sociedade mais inclusiva e tolerante.


Brasília,  10  de  dezembro  de  2015.

Ao  Exmo.  Sr.   Jacques   Wagner,  Ministro-‐Chefe     Casa  Civil  da  Presidência  da  República

Nós,   representantes   de  entidades/movimentos   sociais   ratificamos   nosso   interesse   em colaborar   com   o   avanço   da  Reforma   Psiquiátrica   e   da   Política   Nacional   de   Saúde   Mental, Álcool   e   outras  Drogas.   Por   isso,   vimos   manifestar   nossa   preocupação   em   relação   ao anúncio   de  nomeação   do   Dr.   Valencius   W.   Duarte   Filho,   pelo   Senhor   Ministro   da   Saúde, para  assunção   do   cargo   de   Coordenador   de   Saúde   Mental,   Álcool   e   outras   Drogas   do Ministério  da  Saúde.

Esclarecemos: 1.   A   partir   de   1994,   Dr.   Valencius   W.   Duarte   Filho   foi   Diretor-‐técnico   da   Casa   de  Saúde Dr.   Eiras   de   Paracambi,   condição   em   que   manifestou   publicamente,   por  meio   do   Jornal do Brasil,   crítica   aos   fundamentos   do   projeto   de   lei   n.   3657/1989, cujo substitutivo deu   origem à atual   Lei   federal   n.   10.216/01,   marco   regulatório   da  Política   Nacional   de   Saúde   Mental. Afirmou   serem   os   fundamentos   “de   caráter  ideológico,   e   não   técnico,   e   se   baseiam   em situações   ultrapassadas”   (“Médico  critica   lei   que   extingue   manicômios”,   JB,   07/06/1995).

 2.   A   Casa   de   Saúde   Dr.   Eiras   faz   parte   de   um   histórico   sombrio   da   psiquiatria  brasileira,   uma   vez   que   cumpriu   o   papel   de   ser   o   maior   hospital   psiquiátrico  privado   da   América   Latina.   No   ano   2000,   o   relatório   da   I   Caravana   Nacional   de  Direitos   Humanos,   promovida   pela   Comissão   de   Direitos   Humanos   da   Câmara   dos  Deputados,   constatou   graves   violações   de   direitos   humanos   na   Casa   de   Saúde   Dr.  Eiras   de   Paracambi,   tipicamente   encontradas   nas   grandes   instituições  manicomiais,   tais   como   prática   sistemática   de   eletroconvulsoterapia,   ausência   de  roupas,   alimentação   insuficiente   e   de   má   qualidade   e   número   significativo   de  pessoas   em   internação   de   longa   permanência.   O   Dr.   Valencius   W.   Duarte   Filho  permaneceu   no  cargo   diretivo   deste   estabelecimento   até   o   início   dos   anos   2000.

3.   Considerando   que   a   Lei   n.   10.216/2001   não   mais   reconhece   o   Hospital  Psiquiátrico   na   Rede   que,   em   2011,   é   consagrada   pela   portaria   n.   3088/2011,  preocupa-‐nos   pensar   que   o   Dr.   Valencius   W.   Duarte   Filho   seria   alguém   competente  para   atuar   como   Coordenador   Nacional   de   Saúde   Mental   de   modo   alinhado   aos  princípios   da   Reforma   Psiquiátrica   e   da   Política   Nacional   de   Saúde   Mental,   tendo  em   vista   que,   há   décadas,   tem   uma   contínua   e   ininterrupta   atuação   nesse   tipo   de  estabelecimento.

4.   Dada   a   exigência   de   publicação   científica   como   um   indicador   de   produtividade   no  campo   da   ciência   e   da   academia,   informamos   que   o   Dr.   Valencius   W.   Duarte   Filho   não  possui   trabalhos   publicados   no   âmbito   da   psiquiatria   e   da   saúde   mental,   o   que   torna  insustentável   a   argumentação   do   Sr.   Ministro,   para   quem   o   cargo   exige   autoridade  científica.  (http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4364389E4)

 5.   Nesse   sentido,   o   anúncio   realizado   pelo   Sr.   Ministro   da   Saúde   na   mencionada  audiência   contrapõe-‐se   ao   compromisso   do   governo   federal   com   a   continuidade   da  Política   Nacional   de   Saúde   Mental,   Álcool   e   outras   Drogas,   na   perspectiva   da  garantia   dos   direitos   humanos   e   do   cuidado   territorial   e   comunitário.   Ressaltamos  que   os   princípios   aqui   estabelecidos   são   ratificados   pelas   deliberações   da   XV  Conferencia      Nacional   de   Saúde   e   pelo   Relatório   Final   e   Moções   da   XVIII   Reunião  do   Colegiado   Nacional   de   Coordenadores   de   Saúde   Mental.

6.   Nós,   defensores   da   democracia   brasileira   e,   logo,   contrários   ao   processo  ilegítimo   e   inconstitucional   de   impeachment   da   presidenta   Dilma,   vimos   solicitar   à  Casa   Civil   a   tomada   de   providências   no   sentido   de   sobrestar   a   nomeação   anunciada  para   que   seja   garantida   a   continuidade   da   Politica   Nacional   de   Saúde   Mental,  Álcool   e   outras   Drogas,   legitimada   nacional   e   internacionalmente,   já   que   produzida  e   sustentada   por   este   Governo   no   diálogo   com   usuários,   familiares,   trabalhadores,  gestores   e   academicos   comprometidos   com   a   democracia   e   com   a   produção   de   um  cuidado  em  saúde  mental  de  qualidade,  pautado  na  garantia  de  direitos.

Subscritores
Associação   Brasileira   de   Saúde   Mental/ABRASME
Centro   Brasileiro   de   Estudos   em   Saúde/CEBES
Conselho   Federal   de   Psicolologia/CFP
Instituto  de  Medicina  Social  da  Universidade  Estadual  do  Rio  de   Janeiro/IMS-‐UERJ
Movimento   Nacional   da   Luta   Antimanicomial/MNLA
Rede  Nacional  Internúcleos  da  Luta  Antimanicomial/RENILA

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